29 março, 2017

Mineirinho





Tudo se inicia com a notícia de Mineirinho que era um criminoso violento , e que fora assassinado com 13 tiros pela polícia.

Então é perguntado à empregada, o que ela achava desta notícia. Ela se contorce e diz que Mineirinho e isso todo mundo sabia,  era um bandido e que já matará muita gente.

Talvez muitas pessoas que lerem este conto, o entenderão de maneira equivocada. Talvez acusarão a autora de proteger bandido, o que seria um argumento absurdo, advindo de uma grotesca interpretação de texto.



Porque quem entende desorganiza. Há alguma coisa em nós que desorganizaria tudo – uma coisa que entende. Essa coisa que fica muda diante do homem sem o gorro e sem os sapatos, e para tê-los ele roubou e matou; e fica muda diante do S. Jorge de ouro e diamantes. Essa alguma coisa muito séria em mim fica ainda mais séria diante do homem metralhado. Essa alguma coisa é o assassino em mim? Não, é o desespero em nós. Feito doidos, nós o conhecemos, a esse homem morto onde a grama de radium se incendiara



A autora consegue nos deixar indignados com o excesso da polícia (não tenho nenhuma intenção de denegrir a instituição. Infelizmente alguns policiais ainda não entenderam seus papéis diante da sociedade. Mas o foco aqui não é esse).

Quando inicia a contagem dos tiros e sua reação a cada disparo, é dado um nó na garganta do leitor diante da cena Tarantinesca.



Foi fuzilado na sua força desorientada, enquanto um deus fabricado no último instante abençoa às pressas a minha maldade organizada e a minha justiça estupidificada...



Clarice se formou advogada com o objetivo de trabalhar nas apilhadas cadeias brasileiras. Isso nunca aconteceu e a vida tomou outros rumos como já bem sabemos.

Aqui ela nos apresenta uma visão integral do mundo e da sociedade e suas várias formas de violência.

Olha-se  para a notícia de Mineirinho com pesar, porque está ciente de  que a violência também é nossa. Quando nos abstemos de nos importarmos com a violência que acontece de nosso lado mas com o outro. Então automaticamente acreditamos não nos pertencer.



Até que viesse uma justiça um pouco mais doida. Uma que levasse em conta que todos temos que falar por um homem que se desesperou porque neste a fala humana já falhou, ele já é tão mudo que só o bruto grito desarticulado serve de sinalização. Uma justiça prévia que se lembrasse de que nossa grande luta é a do medo, e que um homem que mata muito é porque teve muito medo



Nós brasileiros não temos senso comunitário, pensamos em fragmentos. E com isso, acabamos pensando somente em nós e em nossa família. O que é um erro, se quisermos construir uma cidade melhor , um país melhor.

Não pense que a violência é "privilégio" dos menos favorecidos. As instituições e os indivíduos podem estar confundindo vingança com justiça. 


Leiam as impressões da Silvia sobre este conto - Blog Reflexões de Silvia -  Clique Aqui




Clarice Lispector - Todos os Contos
       Editora Rocco - Capa Dura - 656 Pgs
        Organizado por Benjamin Moser

                   
                    Marcia Cogitare



6 comentários:

  1. Infelizmente, a violência está por toda parte... e o pior é que ninguém se choca mais...
    Beijo!

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    1. Silvia, estamos realmente em tempos difíceis. E achar a violência normal é um problema sério em nosso país.

      Hug

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  2. Márcia!
    Infelizmente tentamos evitar a violência, porém ela está tão presente que por vezes nós parecemos os bandidos confinados em casa e com pena de morte sobre a cabeça, enquanto eles... ficam a vagar pelas ruas e a cometer atrocidades, o que não quer dizer que a polícia pode também sair matando a torta e direita, porque acabam se igualando aos marginais.
    Desejo um ótimo final de semana!
    “ O amor é a sabedoria dos loucos e a loucura dos sábios.” (Samuel Johnson)
    cheirinhos
    Rudy
    http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
    TOP COMENTARISTA ABRIL especial de aniversário, serão 6 ganhadores, não fique de fora!

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    1. Rudy, infelizmente nosso país tem sofrido muito com violência de todo tipo.
      Mas vamos fazendo nossa parte né.

      Hug

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  3. Oi Márcia, olha esse conto mexeu muito comigo e trouxe várias angustias durante a leitura de sua reflexão. Sou estudante de direito e uma das coisas que mais me angustia ao estudar penal é pensar na seletividade dos criminosos e da violência com que são julgados. Mineirinho foi morto com 13 tiros mas as pessoas esquecem que aquela morte foi só a sua última, o levaram à morte durante toda sua vida quando ele foi impulsionado ao crime. A diferença entre cada um de nós e um criminoso tido como cruel podem ser só as oportunidades. Não queremos combater criminalidade, queremos personificar criminosos e matá-los para erigir uma sociedade mais "justa". O mais triste é pensar que de Clarice para agora parece que não evoluímos em nada. Será que um dia vamos aprender? Beijinhos

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    1. Jade, já se passou mais de 40 anos deste texto e me parece que pioramos ~X

      Clarice era forma em direito, acho que assim como vc , a cabeça dela, era cheia dessas questões sobre justiça.
      Hug :D

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:) :( ;) :D :-/ :P :-O X( :7 B-) :-S :(( :)) :| :-B ~X( L-) (:| =D7 @-) :-w 7:P \m/ :-q :-bd

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