02 novembro, 2016

PJ - Clarice Lispector - Conto 07 - Trecho





Uma mulher invisível socialmente. Ainda naquele tempo, se vivia à sombra do homem.

Flora uma mulher sonhadora, versátil, mãe solteira e amante de Cristiano.


Clarice descreve a espera dessa mulher , que sabe que existe como pessoa e  sabe de toda a sua potencialidade, mas que por alguma razão, se vê esperando seu amante num bar.


E esta espera a vai consumindo e a levando a pensamentos desconexos para preencher o tempo em que passa ali esperando por Cristiano.


Espera, e sente o constrangimento de todos à sua volta estarem acompanhados e ela ali num canto solitária e cheia de incertezas.



Ainda hoje sentimos os vestígios de tal realidade, vinda  dos séculos passados.


Que a mulher não pode ir à uma festa ou a um cinema sozinha. Muitas mulheres ainda se sentem constrangidas, perdidas, inadequadas em tais situações.

Parece a dor fantasma de um membro físico que já não existe, mas a dor persiste.


E a maioria dos homens que as vêem sozinhas nestes ambientes, pensam que estão a procura de um caso para preencher sua noite (bem, não nasci grudada com macho. Na verdade nasci, já que sou gêmea de um menino). 

Me desculpem pela grosseria, mas é que me descontrolo quando ouço tais diálogos, e estes não são diálogos ficcionais, uma pena.


Sim, podemos nos divertir sem ter que recorrer a alguém do sexo oposto. Mas tem homem que ainda pensa o contrário. Só lamento (tô azeda hoje , aguentem rs).





Realmente nada aconteceu naquela tarde cinzenta de abril. Tudo, no entanto, prognosticava um grande dia. Ele lhe avisara que sua vinda constituiria o grande fato, o acontecimento máximo de suas vidas. Por isso ela entrou no bar da Avenida, sentou-se junto a uma das mesinhas da janela, para vê-lo, mal apontasse na esquina. O garçom limpou a mesa e perguntou-lhe o que desejava. Dessa vez justamente não precisava ficar tímida e ter medo de cometer uma gafe. Estava esperando alguém, respondeu. Ele olhou-a um momento. “Será que tenho um ar tão abandonado que não posso estar esperando alguém?” disse-lhe:
– Espero um amigo.


Acredito que passou da hora de abandonarmos a canção de Fábio Jr (a metade da laranja…) e tudo que configura este tipo de pensamento dependente da figura masculina.

Eu me basto, não sou incompleta, não busco minha cara metade e blábláblá…



E esta forma de pensar nos afeta em todos os âmbitos e não somente entre as 4 paredes.

Parece que nós mulheres sempre estamos em débito. Isso é extremamente cansativo. Sobretudo no campo profissional.




...Ora, naturalmente que ela sabia fazer diversas coisas e até muito bem-feitas. Mas ela não era nenhuma daquelas personalidades que encarnava para se divertir ou por necessidade. Flora era outra que ninguém descobrira ainda! Eis o mistério


Os papéis fixos já caíram em desuso. Hoje quem sai na frente é quem pensa numa “identidade” móvel, que se permite ser e ter características de ambos os gêneros.


Claro que para muita gente isso é algo estranho, e que prefere manter os modelos antigos e ultrapassados.


Modelo onde se disputa e se digladiam, a luta entre os gêneros,  que só trazem cansaço e amargura. Só há perdedores nesta disputa árida e irracional.

Borá reciclar nossos conceitos sobre gênero, isso só nos trará o bem.


Leiam também a resenha da Silvia do Blog Reflexões e Angústias, tenho certeza que você irá curtir.

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Clarice Lispector - Todos os Contos
Editora Rocco 
Capa Dura - Pgs 656
Organizador - Benjamin Moser



Marcia Cogitare





7 comentários:

  1. A mulher é parceira do homem desde que a raça humana existe. Antes de diferença de etnia ou qualquer outra minoria que brigue por reconhecimento, já representávamos 50% dos seres. E parece que a mulher ser vista como uma pessoa com os mesmos direitos dos homens será a igualdade mais difícil de ser obtida... É impressionante isso...
    Seguimos na batalha...
    Beijo!

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    1. Oi Silvia, realmente chega ser ridículo ainda falarmos sobre direitos nesta altura do campeonato. Deveria ser algo natural, mas ainda não é.

      Infelizmente neste quesito ainda estamos na era primitiva.

      Hug

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  2. Gostaria de ler esse conto também. Coitada da personagem, tão desiludida. Quem dera pudéssemos entrar nas páginas do livro e dizer a ela que ela pode dançar, beber, sair e fazer qualquer coisa que lhe der na telha sem a presença de um homem ao seu lado.

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    1. Lavinia, o pior de tudo que mesmo em 2016, ainda muitas mulheres cultivam o ideal do amor romântico.
      E isso tem acabado com as relações reais.

      Hug :D

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  3. A obra ds Clarice é incrível no empoderamento feminino, ela não fala do que deve se fazer e sim nos faz pensar em como as atitudes arcaicas e patriarcais são absurdas. Acho que contos como esse são uma das maiores formas de mudar nosso pensamento, vemos essa mulher se sentir estranha e julgada pelos outros só por estar sozinha momentaneamente (alguém conta pra eles que ficar só pode ser muito maravilhoso!). O que achei mais interessante é que independente dos outros ela mesmo peca ao se julgar e procurar desculpas pela ausência do homem. É como você disse na sua resenha Márcia: ela precisa aprender a se bastar. Beijos

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    1. Jade,quando li este texto me deu uma tristeza danada.
      Este texto deve ter uns 50 e estamos lutando pelas mesmíssima coisas. Bate uma bad, mas não podemos esmorecer.

      A batalha é árdua minha amiga.

      Hug :D

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  4. Que dó dela :(
    Odeio que as pessoas ainda olhem para nós como "coitadinha da sociedade" só por estarmos sozinhas, coisa chata gente.
    É exatamente tudo o que vc disse Márcia..
    Acho que as pessoas (homens) ainda não entenderam que não precisamos dele para tudo :/

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:) :( ;) :D :-/ :P :-O X( :7 B-) :-S :(( :)) :| :-B ~X( L-) (:| =D7 @-) :-w 7:P \m/ :-q :-bd

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