05 abril, 2017

Restos do carnaval




Este conto é tão melancólico, e justamente o localiza dentro de uma das maiores festas brasileiras, o carnaval.



Uma garotinha de 8 anos, que como toda menina desta idade, deseja se sentir mais madura ou até mesmo deseja se tornar logo uma adulta.




Nesses três dias, ainda, minha irmã acedia ao meu sonho intenso de ser uma moça – eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável – e pintava minha boca de batom bem forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu escapava da meninice




Uma de suas amiguinhas que também se preparava para o carnaval com sua fantasia de papel crepom
Durante a tosca confecção acabou por sobrar muito papel crepom, da qual sua mãe decide fazer a mesma fantasia de rosa para sua amiga.




Quanto ao fato de minha fantasia só existir por causa das sobras de outra, engoli com alguma dor meu orgulho que sempre fora feroz, e aceitei humilde o que o destino me dava de esmola.Mas por que exatamente aquele carnaval, o único de fantasia, teve que ser tão melancólico?





E no carnaval ela vê sua chance de crescimento momentâneo. Pede a irmã que enrole seus cabelos e passe um batom escuro e ruge em suas bochechas infantis.
Tudo pronto para o dia de domingo e para a tão esperada celebração.



Justamente no dia da festa a sua mãe doente, piora muito e ela é mandada correndo para a farmácia vestida com sua fantasia de restos de papel crepom.


Mais tarde, quando tudo se acalmou, ela é maquiada e tenta retomar o espírito de festividade, mas algo se quebrou nela. Talvez se sentisse culpada por festejar na rua entre as pessoas desconhecidas e lembrar da mãe doente em casa.


Este conto da vontade de pegar essa criança no colo e dizer que tudo irá ficar bem.




E as máscaras? Eu tinha medo mas era um medo vital e necessário porque vinha ao encontro da minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma espécie de máscara





Certamente Clarice se baseou em sua própria infância, onde sua mãe doente (na biografia de Benjamin Moser é dito que a mãe foi estuprada num dos pogrons (perseguição aos judeus no império russo e em outros páises) na Ucrânia e contraiu sífilis. Naquele tempo não tinha sido inventado a penicilina).

Existia um ditado ucraniano que dizia que o nascimento de um filho curaria  a enfermidade daquela mãe.


Clarice tinha este peso em sua vida pessoal, ela foi a filha que não conseguiu salva a mãe.
Ela se refere à ela mesma em um de seus livros, como uma pessoa falhada.
Acredito que se trate desta missão dada à ela,  antes mesmo de seu nascimento.




Não se esqueçam de dar uma espiadinha nas impressões da Silvia sobre este conto – Blog Reflexões de Silvia




*Este conto pertence ao livro – Felicidade Clandestina





Clarice Lispector - Todos os Contos
       Editora Rocco - Capa Dura - 656 Pgs
        Organizado por Benjamin Moser

                   
                    Marcia Cogitare









4 comentários:

  1. Este conto é de uma extrema sensibilidade, não é?
    Gostei muito!

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    1. Concordo, Silvia.
      Existe uma delicadeza um cuidado no tom do conto.

      Hug

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  2. Oi Marcia, acho que sem essa sua explicação no final não conseguiria entender realmente a relação da história com a vida da autora, as marcas feitas na criança que ela foi permaneceram, o que é muito triste. Realmente senti muita dó pela criança sofrendo e pela metáfora que ela fez com sua própria vida. Beijinhos

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    1. Jade, na hora me veio na mente a realidade da menina Clarice recém chega ao Brasil e com a mãe doente.
      Tão triste ler neste conto uma parte infeliz de sua vida infantil.

      Hug :D

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:) :( ;) :D :-/ :P :-O X( :7 B-) :-S :(( :)) :| :-B ~X( L-) (:| =D7 @-) :-w 7:P \m/ :-q :-bd

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