18 fevereiro, 2017

Viagem a Petrópolis





Estou numa semana muito sensível, já chorei vendo filme  indicado ao Oscar deste ano e para fechar a semana , Clarice lasca este conto com personagens desgracentos na minha face. Que me fez lembrar da pessoa mais importante da minha vida, minha vozinha que não está mais aqui para rirmos, eita véinha divertida ela era (sinto muito sua falta vó).


Gente, num guento quando o assunto é criança , velhinho e bicho vivendo na sofrência. Isso acaba comigo.


Aqui Clarice vai nos apresentar uma velhinha esquálida, sorridente (na minha opinião ela não tinha motivos para sorrir. Talvez fosse um jeito de humanizar o outro que ela encontrou) que pedia esmolas e vivia da bondade dos outros, sozinha no mundo, dependia da bondade alheia para não dormir na rua.



Era uma velha sequinha que, doce e obstinada, não parecia compreender que estava só no mundo. Os olhos lacrimejavam sempre, as mãos repousavam sobre o vestido preto e opaco, velho documento de sua vida. No tecido já endurecido encontravam-se pequenas crostas de pão coladas pela baba que lhe ressurgia agora em lembrança do berço. Lá estava uma nódoa amarelada, de um ovo que comera há duas semanas. E as marcas dos lugares onde dormia



Numa dessas andanças ela se fixa em uma casa grande em Botafogo e com o passar do tempo essa família fica de saco cheio dessa velhinha e a mandam para a casa de outro parente em Petrópolis.


A forma como é feito isso é tão desumana, apenas a deixam perto da casa , a instruem o que dizer para seus novos “donos”. 
Claro que isso dá muito errado, o tal parente dá um dinheirinho e manda a senhora de volta.



O rapaz disse para as irmãs:Acho melhor não pararmos defronte, para evitar histórias. Ela salta do carro, a gente ensina aonde é, ela vai sozinha e dá o recado de que é para ficar


Sem nenhum abalo, talvez por estar acostumada a ser preterida devido a sua condição,  resolve  caminhar pela linda Petrópolis.

Ela sempre teve este hábito de andar horas pelas ruas de onde residisse. Mesmo quando morava no Maranhão sua cidade natal, onde viveu com seus filhos e marido, todos mortos agora.



Ele não era louro. Falou em voz baixa com a mulher, e depois de demorada confabulação, informou firme e curioso para Mocinha:Não pode ser não, aqui não tem lugar não.E como a velha não protestasse e continuasse a sorrir, ele falou mais alto:Não tem lugar não, ouviu?Mas Mocinha continuava sentada. Arnaldo ensaiou um gesto. Olhou para as duas mulheres na sala e vagamente sentiu o cômico do contraste. A esposa esticada e vermelha. E mais adiante a velha murcha e escura, com uma sucessão de peles secas penduradas nos ombros. Diante do sorriso malicioso da velha, ele se impacientou:E agora estou muito ocupado! Eu lhe dou dinheiro e você toma o trem para o Rio, ouviu? volta para a casa de minha mãe, chega lá e diz: casa de Arnaldo não é asilo, viu? aqui não tem lugar. Diz assim: casa de Arnaldo não é asilo não, viu!




Clarice foi misericordiosa com nossa personagem, não a deixou passar por mais sofrimentos.


Margarida (Mocinha como ela gostava de ser chamada) fechou seus olhos depois de tomar água fresca na fonte , sentou -se embaixo de uma árvore e morreu com a imagem da bela Petrópolis em sua mente cansada. 



E não se esqueçam de ler a resenha da Silvia sobre este conto. 





*Este conto faz parte do livro - A Legião Estrangeira




Clarice Lispector - Todos os Contos
       Editora Rocco - Capa Dura - 656 Pgs
        Organizado por Benjamin Moser

                   
                    Marcia Cogitare




4 comentários:

  1. Esse conto é realmente triste e faz com que fiquemos muito tocados pelo que acontece com Mocinha... E sabe o que é pior? É que não é apenas uma história de contos... As pessoas idosas sofrem muito. O mundo ainda não está preparado para acolhê-las.
    Um lindo final de semana, Marcia!

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  2. Silvia, realmente o mais triste é saber que os idosos são muito mal tratados como mesma disse , falta preparaçåo por parte das pessoas para recebe los.
    Hug

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  3. Nossa Márcia, que história triste desse conto, pobre velhinha. É triste pensar que realmente nossa sociedade pode ser cruel assim com pessoas mais velhas sem família (as vezes até com as com família), se o conto de Clarice nos parece forte imagine a realidade que o inspirou? Beijos

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  4. Jade, este conto meche com a gente mesmo.
    A realidade é ainda mais dolorosa.

    Mas gosto como Clarice foi boa com a personagem

    Hug

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